domingo, janeiro 30, 2011

Estranho artista


Lendo o meu livro "100 años de soledad", agora marcado na página 62, olho para o marcador de páginas me lembro como ele chegou às minhas mãos.
A melhor coisa para se fazer em Veneza é caminhar pelas suas ruelas até se perder, tentar um caminho, se deparar com água, retornar e tentar outra vez . Um verdadeiro labirinto! E nesse jogo de tentativa e erro é possivel apreciar os seus encantos, a sua arquitetura, ateliês de arte, as suas vitrines cheias de guloseimas convidativas. Mas naquele dia eu andava sem a pretenção de me perder. O objetivo era chegar até a estação Santa Lucia a tempo de pegar o trem para Florenza, e eis que de lá, da lojnha de livros, quadros e papeis coloridos, aquele homem me chama, olho para tras e a pressa me faz continuar rumo a estação. Mas ele insiste e me convida para entrar.
-Quero te dar um presente - disse ele numa mistura de italiano e espanhol
-Não, obrigada, nao precisa se preocupar
-Por favor, eu quero te dar um presente, é muito rápido, não vai te atrapalhar
Projetei só metade do meu corpo para dentro da loja, para significar a minha pressa, mas ele ja foi estendendo mão, me entregando o marcador juntamente com um lapis com o mesma estampa.
-Nao, não precisa mesmo. Obrigada! Eu preciso ir para não perder o trem.
-Olha, eu sou um artista - E me mostrava na parede as suas obras - e eu gostaria de pintar um retrato seu.
Mas eu persistia em recusar, com o argumento de não perder o trem, e ele insistia. Disse que não levaria mais de 10 minutos, que pintaria o meu rosto e me daria o quadro como presente. Então eu pensei, por que não? Com um olhar de raio X avaliei a "segurança" do local. Ateliê, com portas de vidro, destrancadas, expostas a qualquer mortal que passasse na rua, e além do mais, seria a pintura do meu rosto, nada além do que estava exposto. Entao topei.
_Ok, tudo bem, mas não tenho muito tempo.
Então, ele me disse para acompanhá-lo, trancou o ateliê e começou a caminhar pelas ruas estreitas da cidade, até que virou á esquerda em uma delas e eu simplismente...não o segui....hehehe...fiquei com medo, sai correndo, entrei na proxima rua a direita e num zig zag fui parar na estação de trem. É fácil de se perder e fácil também de se livrar de estranhos artistas que se propoem a pintar o rosto de uma brasileira perdida em Veneza.

Tratamento de Choque


Era uma viagem que eu, supostamente deveria fazer sozinha, então, muito preocupado com a minha segurança, meu pai comprou para mim um aparelho de choque para defesa pessoal, cuja voltagem é de 1900KV . O que isso significa? Dá pra derrubar um e ainda sobram uns minutinhos para correr. Mas ele só deve ser utilizado, quando se tem a certeza que se tem para onde correr para buscar ajuda, enquanto o suposto agressor desfruta por alguns minutos do efeito do aparelho mágico. Durantee todos os meus 4 meses viajando pela America do Sul - terceiro mundo - eu nunca precisei utilizá-lo. Não apenas por não me sentir ameaçada, mas por que nunca o quiz portar comigo.


A casa 3 da Tiltwood St. tornou-se o meu endereço em Londres durante quase 2 meses; meu verdadeiro lar, onde deixei os meus poucos pertences espalhados, descansando do confinamento da mochila amarela. Na hora de arrumar as malas para partir para israel, cujo voo sairia no dia 06 de janeiro de 2011, precisei iniciar o processo bem cedo, com alguns dias de antecedencia, para me certificar de não estar esquecendo nada. No aeroporto em Amsterdã, onde fiz a minha conexão, a agente da imigração - muito simpática - me fazia perguntas que eu não estava acostumada a responder. Perguntava-me se eu mesma havia arrumado a minha mala, se eu sabia de tudo que ela continha, se eu fiquei com ela durante todo o trajeto até o aeroporto, se quem estava comigo no caminho era de confiança. Todas as respostas foram "Sim", acompanhadas de um olhar de estranheza. Bagagens de mão avaliadas pela máquina de raio X do aeroporto de Londres e de Amsterdã confirmaram as minhas respostas afirmativas, comprovando que nelas eu carregava apenas os itens permitidos. Chegando em Israel, ja devidamente acomodada, começo a "desconfinar" os meus pertences e eis que encontro na minha bagagem de mão o presentinho que papai havia me dado. O choque! Fiquei em Choque!Foi como ser atingida pelos 1900KV do aparelhinho, que de mágico poderia virar trágico.

O que apareceu para servir de defesa pessoal poderia ter me trazido sérias complicações, simplismente pela minha falta de atenção. Como explicar aquela arma branca na minha bagagem de mão?? Eu poderia estar nas páginas dos jornais, estampada como A TERRORISTA!