segunda-feira, julho 24, 2006

Dedicatória do Autor

"...A todos esses que em mim atingiram zonas assustadoramente ineperadas, todos esses profetas do presente e que a mim me vaticinaram a mim mesmo a ponto de eu nesse instante explodir em: eu. Esse eu que é vós, pois não aguento mais ser apenas mim, preciso dos outros para me manter de pé, tão tonto que sou, eu enviesado, enfim que é que se há de fazer senão meditar para cair naquele vazio pleno que só se atinge com a meditação. Meditar não precisa de ter resultados: a meditação pode ter como fim apenas ela mesma. Eu medito sem palavras e sobre o nada. O que atrapalha a vida é escrever.
E-e não esquecer que a estrutura do átomo não é vista mas sabe-se dela. Sei de muita coisa que não vi. E vós também. Não se pode dar uma prova da existência do que é mais verdadeiro, o jeito é acreditar. Acreditar chorando..."

Clarice Lispector em "A hora da Estrela"
Vou me divertir esses dias com esta dádiva...

terça-feira, julho 18, 2006

Mas que coisa!

Uma coisa é inutil enquanto simplismente coisa. Fitei uma cadeira e duvidei da sua existência. Uma cadeira só é uma cadeira quando estou usando-a. Minha caneta, meu lápis, meu som...Tantas coisas são sempre apenas tantas coisas. Uma luneta não é nada para mim. To pensando até em comprar uma, deve servir pra olhar pro céu. E que coisa linda é uma estrela. Quer dizer, nem sei se estrelas são coisas. Eu não as uso com muita frequencia, e elas, iponentes , nunca deixam de ser. E o amor, só é amor quando se ama? Tem um moço que amo mesmo sem estar amando-0, de vez em quando fecho os olhos e descubro que aquele amor está lá. Sendo assim, o amor não é coisa nenhuma, pois a sua utilidade reside no simples ato de amar. Mas tem gente que precisa de coisas pra acreditar que o amor existe. Seriam as palavras coisas também? Qual a utilidade da palavra medo? Depois que eu a utilizo para descrever a sensação que tenho quando estou na altura infinita do precipício ela deixa de fazer sentido. Eu digo "medo", você consegue imaginar o que estou sentindo, e a palavra em si, deixa de existir.
Me lembrei de alguém que vivia me pedindo coisas para acreditar no meu sentimento, e um sorriso nunca serviu. Sorriso não é coisa, pois ele se perpetua depois que se encerra o ato de sorrir. É difícil caracterizar o que é de fato uma "coisa". E que coisa esquisita sou eu. Coisa? Tem sido constante o uso que faço de mim, mas não deixo de ser quando não utilizo o potencial que sou. Ou deixo? Meu Deus! Estou me sentindo a cadeira que fitei antes de começar a escrever...

segunda-feira, julho 17, 2006

Felicidade inexplicável


Viva a felicidade,
Abolindo quase toda maldade
Como se o amor troxesse o gosto da infância...

(Não sei quem é o compositor, mas Vanessa da Mata canta)

sexta-feira, julho 07, 2006

Um pedido inusitado

-Então vamos fazer um rangão?

Essa história de Thays se alimentar saudavelmente está me influenciando. Fomos ao mercado comprar folhas, verduras, massa integral...coisas desse tipo.

Eu me assustei quando ouvi a voz masculina atrás de mim. Estava na fila, terminando de enviar uma mensagem pelo celular. Olhei pra tráz e me deparei com aquelas feições que exibiam uns quarenta e poucos anos de cansaço, embriaguez, desgosto e tristeza.

-A senhora pode pagar pra mim? Perguntou ele levantando uma calabresa que fazia escorrer óleo em suas mãos. Afirmei que sim apenas com um aceno de cabeça, e fiquei tentando imaginar quanto custaria (em dinheiro) aquela boa ação. Após um período de silêncio, incomodada com o odor de alcool que exalava dele, perguntei:
- Estava bebendo foi?

Ele negou e começou a repetir aquele discurso comum entre os pedintes. "Eu não tomo nada de ninguém, feio é roubar, aliás, acho até que eu merecia mais do que isso da senhora". O teor das palavras não me agradou, soou como um prelúdio a um assalto.
Nas outras filas, as pessoas olhavam para nós e teciam comentários que eu não consegui identificar quais.

Thays, que tinha ido buscar o pão que haviamos esquecido, retornou e, notando a presença dele, lançou aquele olhar amedrontador que só ela tem, e que é capaz de deixar qualquer um sem ar. Ergueu as sombrancelhas para mim, num gesto de quem pergunta "O que está acontecendo?". E eu, também com o olhar, respondi que estava tudo bem.

-Vai comer isso aí com que? - Perguntou ela
- Com arroz
- Já tem arroz em casa?
- Já sim senhora. Só não tenho casa.
- E a farinha, já tem? Sobrepus a pergunta para não permitir que a resposta anterior penetrasse completamente na minha cabeça.
- Não senhora, não precisa
- Tem certeza que não quer levar o arroz? Thays insitiu
- Não senhora, mas sabe o que eu queria?
Esperamos ele responder imaginando que seria pedido feijão, macarrão, ou um quilo de frango até.

-Um salgadinho, preu levar pros meus filhos.

O olhar de surpresa de Thays foi notório. Lembrei daqueles dias que a gente tem vontade de fazer uma estravagância. Pedir o prato mais caro do restaurante, tomar um pote de sorvetes, beber o melhor vinho, mesmo que isso vá custar um pouquinho mais.

-Quanto filhos o senhor tem?
Ele respondeu com o dedos, e um sorriso disfarçado no rosto, que eram dois.
-Então pegue dois.

Thays ficou preocupada de ele não conseguir encontrar a nossa fila quando voltasse, mas em poucos minutos ele retornou com os dois pacotes de salgadinho na mão - um da elma chips e o outro de qualidade inferior.

-O senhor mora onde?
- Eu não tenho casa não senhora. Sou de Recife e to morando lá no viaduto da fonte nova. Às vezes moro lá, às vezes em um que tem lá em nazaré.
- E como é o nome do Sr?

Fernado José e um sobrenome que eu não consigo lembrar. Este era o nome da criatura suja que nos colocava de frente com a pobreza, a miséria, o frio e a falta de perspectiva.

-E porque o senhor estava bebendo? -Thays não cansava de tantas perguntas
- Senhora?
- PORQUE-O-SENHOR-ESTAVA-BEBENDO? Repetiu ela de forma bem articulada.
-Desgosto da vida! Respondeu instantâneamente. Provocando em mim um silêncio ensurdecedor, enquanto aquela história de vida provocava ruídos intensos em minha cabeça.

-E o senhor tem família em Recife?- Peguntei
-Tenho um irmão
-E ele não te ajuda?
- Não. - Fernado José riu.- Ele é sargento da polícia. Disse pra eu fazer por mim, porque ele fez por ele. As únicas pessoas que eram boas pra mim eram meu pai e minha mãe. Mas eles já morreram. O meu pai, pra senhora ter uma idéia, ao invés de me levar pra morar em um lugar decente, me levou pra morar com um monte de tarado.

Não compreendi a aparente contradição da informação.
-Tarado?- Indaguei
-Sim tarado!

Thays, mais uma vez, com um simples olhar conseguiu evitar que eu insistisse em arrancar detalhes da informação.

Estávamos impacientes porque o cliente da nossa frente tinha desistido de um ítem da compra e foi uma demora insuportável até o fiscal responsável pelo cancelamento chegar.
- Vamos deixar tudo aí e ir pra casa. Não aguento mais esperar. - Sugeriu Thays.
- Não senhora, epere mais um pouco. - Suplicou.

Os seguranças da loja ja estavam se mobilizando com seus aparelhos de rádio e olhares intimidadores.
- Algum problema aí?
- Ele está com a gente. -Respondemos
Ainda ouvi o comentário de um deles "fica dando ousadia, depois quando é assaltada lá fora, acha ruim."

As mercadorias dele foram registradas primeiro, ele embalou-as num saco e estendeu a mão para omprimentar Thays- Aquela mesma mão lambusada que segurava a calabresa pingando óleo. Depois de muito hesitar, ela retribuiu o ato, estendendo-o a mão. O cumprimento foi desses modernos que se dá um tapinha não mão e depois uma espécie de murro. Repetiu o cumprimento comigo, agradeceu-nos e sorrindo saiu caminhando com sua sacola na mão..

47 reais e oitenta e nove centavos foi o valor total da compra. Dos quais 3, 18 era a soma do preço de uma calabreza, um salgadinho da elma chips e um outro de qualidade inferior.

terça-feira, julho 04, 2006

Conto em letras Garrafais

"Todos os dias esvasiava uma garrafa, colocava o seu pedido e jogava-a no mar. Nunca recebeu resposta, mas tornou-se alcoolatra."


*Li este conto no 3° ano, num lembro o nome do autor...